Denúncias de Trabalho Escravo em Grandes Festivais
Rock in Rio na ‘Lista Suja’ por Trabalho Escravo: A Rock World, empresa responsável pela organização de eventos como Rock in Rio, Lollapalooza e The Town, foi incluída na “lista suja” do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) por práticas de trabalho análogo à escravidão. A decisão, publicada em 23 de maio de 2025, decorre de uma operação realizada em setembro de 2024, que resgatou 14 trabalhadores em condições precárias durante o Rock in Rio. Esta não é a primeira vez que grandes festivais de música enfrentam denúncias desse tipo, levantando questões sobre a responsabilidade das organizadoras e suas terceirizadas.
O Caso do Rock in Rio 2024: Fiscalização e Resgate
No dia 22 de setembro de 2024, uma força-tarefa composta por auditores fiscais do MTE e procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) inspecionou as instalações do Rock in Rio, no Rio de Janeiro. A operação identificou 14 trabalhadores da empresa terceirizada FBC Backstage Eventos Ltda em condições degradantes. Eles atuavam como carregadores de equipamentos, como grades, bebidas e estruturas metálicas, e foram encontrados dormindo sobre papelões, lonas e sacos plásticos, em um ambiente sujo, com banheiros precários e jornadas exaustivas de até 21 horas.
Os trabalhadores relataram receber diárias entre R$ 90 e R$ 150, dependendo das horas trabalhadas, mas enfrentavam condições que configuram trabalho análogo à escravidão, incluindo alojamento inadequado, jornadas excessivas e trabalho forçado. A fiscalização emitiu 21 autos de infração contra a FBC Backstage e 11 contra a Rock World, responsabilizando diretamente a organizadora por negligência na fiscalização das terceirizadas.
Inclusão na ‘Lista Suja’
Após a Rock World exercer seu direito de defesa administrativa, o MTE confirmou sua inclusão na “lista suja”, um cadastro que expõe empregadores flagrados em práticas de trabalho escravo. A empresa permanecerá na lista por dois anos, a menos que firme um termo de ajustamento de conduta (TAC) e cumpra critérios de reparação. A FBC Backstage já havia sido incluída no cadastro em abril de 2025. Apesar de não impor sanções financeiras diretas, a lista é utilizada por bancos e empresas para gerenciar riscos comerciais, impactando a reputação e as operações das organizações listadas.
Histórico de Irregularidades: Casos Anteriores no Rock in Rio
O Rock in Rio já enfrentou denúncias semelhantes. Em 2013, 93 trabalhadores foram resgatados de uma empresa terceirizada do setor de fast food (Bob’s), que cobrava credenciamento e submetia funcionários a condições degradantes. Em 2015, 17 pessoas foram resgatadas em situação semelhante, trabalhando para a empresa Batata no Cone, que vendia batatas fritas no festival. Em ambos os casos, a responsabilidade recaiu sobre as terceirizadas, mas, em 2024, a Rock World foi considerada diretamente responsável devido à falta de supervisão.
Lollapalooza e Outros Festivais
O Lollapalooza também registra histórico de irregularidades. Em 2023, cinco trabalhadores foram resgatados em condições análogas à escravidão durante a montagem do festival em São Paulo, sob responsabilidade da T4F, antiga organizadora. A empresa terceirizada Yellow Stripe foi autuada, e a T4F rescindiu o contrato com a prestadora de serviços. Desde então, a Rock World assumiu a produção do Lollapalooza, mas as denúncias persistem, apontando para um problema sistêmico na gestão de terceirizadas em grandes eventos.
Reação da Rock World e do MPT
Em nota, a Rock World repudiou as acusações, afirmando que as irregularidades foram cometidas pela FBC Backstage e não caracterizam trabalho escravo. A empresa recusou o TAC proposto pelo MPT, alegando que as acusações foram precipitadas. A organização destacou seu compromisso com a legislação trabalhista e afirmou que tomou medidas contra a terceirizada assim que soube do caso.
O MPT, por sua vez, exigiu esclarecimentos da empresa que certificou o Rock in Rio como “evento sustentável” e notificou patrocinadores para que informem medidas contra o uso de trabalho escravo em suas ativações. O procurador Thiago Gurjão criticou as condições encontradas, destacando que “não é aceitável que trabalhadores durmam em papelões após jornadas de 20 horas em um evento que promove sustentabilidade”.
Impactos e Consequências: Reputação e Mercado
A inclusão na “lista suja” pode afetar a reputação da Rock World e sua relação com patrocinadores, bancos e parceiros comerciais. O cadastro, criado em 2003, é reconhecido pela ONU como referência no combate ao trabalho escravo, mas não impõe bloqueios diretos. Ainda assim, empresas listadas enfrentam dificuldades em acessar crédito e fechar contratos, devido ao risco reputacional.
Medidas Legais
O MPT anunciou que adotará medidas para evitar novas irregularidades, incluindo ações por danos morais individuais e coletivos. Os trabalhadores resgatados receberam verbas rescisórias e três parcelas de seguro-desemprego, equivalente a um salário mínimo cada. A vice-procuradora Isabela Maul reforçou que a fiscalização será intensificada nas próximas edições do Rock in Rio e outros eventos.
Contexto Nacional
Em 2024, o Brasil resgatou cerca de 1,9 mil trabalhadores em condições análogas à escravidão, número inferior aos 3,2 mil de 2023. Desde 1995, mais de 65 mil pessoas foram libertadas de situações semelhantes. Denúncias podem ser feitas de forma sigilosa pelo Sistema Ipê, do MTE. Minas Gerais lidera o ranking de casos, com 22% dos 727 empregadores listados na atualização de 2024.
O caso da Rock World reacende o debate sobre a responsabilidade de grandes empresas na fiscalização de suas cadeias produtivas, especialmente em eventos de grande porte que movimentam milhões de reais e atraem milhares de pessoas.
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